O Centro de Pesquisa Canguçu completa 25 anos hoje, dia 05 de agosto, e essa matéria poderia começar falando… Localizado no sudoeste do Tocantins, nas confluências do Parque Nacional do Araguaia e da Ilha do Bananal, o Canguçu se encontra em uma região extremamente preservada, com mata nativa e um grande número de registros de fauna e flora. Este centro é um ponto de encontro entre dois dos biomas mais biodiversos do planeta: o Cerrado e a Amazônia. Essa área de transição entre os biomas cria um ambiente de grande diversidade biológica, repleto de peculiaridades que têm sido palco para inúmeras pesquisas e descobertas.
Mas muitos já conhecem essas características. Para comemorar esses 25 anos, queremos destacar algumas das histórias e peculiaridades que fazem do Canguçu um lugar mágico para todos que o frequentam, seja para pesquisa, ecoturismo, treinamentos ou outras atividades. Este espaço, tão rico em biodiversidade, guarda memórias especiais e desempenha um papel fundamental na conservação e estudo da natureza.
Mascotes
No coração do Centro de Pesquisa Canguçu, onde a ciência encontra a natureza, alguns mascotes se tornaram parte do cotidiano do lugar. A Pretinha, uma anta doce e amigável, é uma visitante diária que encanta todos os que têm a sorte de encontrá-la. Ela vive na floresta, mas todas as tardes vai ao Canguçu para saborear um pouco de milho, gentilmente deixado pela equipe. Com o tempo, ela se acostumou com a presença humana e agora é uma celebridade local, turistas e pesquisadores se encantam com sua mansidão, tirando fotos e registrando seus momentos únicos. Não é raro vê-la acompanhada de seus filhotes ou até de um macho durante sua fase de fertilidade, tornando cada visita uma surpresa.
E não podemos esquecer do Jack, um antigo morador das águas do Canguçu. Esse jacaré enorme era uma figura constante nos arredores do pier, especialmente quando havia pescaria. Peixes e piranhas eram seu banquete, gentilmente oferecidos pelos pescadores e visitantes. Com o tempo, Jack se tornou praticamente domesticado, saindo da água para pegar seu lanche e surpreendendo todos com sua imponência. Infelizmente ele foi encontrado morto, mas deixou muitas boas lembranças antes disso acontecer.
Visita do Rei da Inglaterra
Em março de 2002, o Centro de Pesquisa Canguçu recebeu Charles Philip Arthur George, o então príncipe Charles e hoje rei da Inglaterra. O príncipe pousou no aeroporto de Palmas com o objetivo de conhecer de perto os projetos ambientais, as comunidades indígenas e as regiões mais importantes do Tocantins. Isso aconteceu, pois a estrutura física do Centro de Pesquisa Canguçu foi proporcionada por fundos oriundos de uma mineradora inglesa, como compensação ambiental. Esse apoio financeiro foi crucial para a criação e desenvolvimento do centro, que sempre teve como objetivo a pesquisa e o conhecimento da biodiversidade local.
Engajado nas causas ambientais, o na época príncipe Charles fez questão de incluir o Canguçu em seu itinerário, reconhecendo a importância do trabalho desenvolvido ali. A visita foi breve, mas significativa, destacando o compromisso internacional com a preservação ambiental e o estudo da rica biodiversidade do Cerrado.
Guardiões do Canguçu
Outros dois personagens conhecidos por quem já passou por lá, são Roberto e Sulene. Ambos estão ligados ao Canguçu desde antes de sua fundação e continuam a dedicar suas vidas ao local com paixão e dedicação. Roberto viveu a construção do centro e foi responsável por conduzir a embarcação que levou o príncipe Charles durante a inauguração. Como guia e mateiro, ele orienta os pesquisadores pelas trilhas e pela floresta, além de ajudar na observação de animais e na pilotagem dos barcos, seja para atividades recreativas ou de pesquisa. Seu conhecimento e experiência são importantes para todos que visitam o Canguçu.
Sulene, por sua vez, cuida da conservação do centro. Junto com outros servidores, ela é responsável pela limpeza, manutenção e reporta tudo que precisa ser feito. Além disso, Sulene é uma cozinheira talentosa, capaz de transformar ingredientes simples em refeições deliciosas e rápidas para os visitantes que chegam ao Centro. A presença dela garante que o centro funcione bem, mesmo em um ambiente afastado e com recursos limitados.
Descobertas e pesquisa
Como o próprio nome indica, o Centro de Pesquisa Canguçu recebe pessoas do mundo inteiro para atividades científicas. Um fato relevante desse processo de pesquisa é a colaboração com pesquisadores de diversas instituições. Um exemplo notável é a visita de pesquisadores da UFRJ, especialistas na ictiofauna dos rios Javaés e Araguaia. Durante suas pesquisas, eles identificaram uma nova espécie de candiru, um tipo de bagre, e nomearam essa espécie em homenagem ao Canguçu com o nome de Paracanthopoma Cangussu. Destaca-se ainda, que outras espécies de peixes também foram descobertas por professores pesquisadores da UFT.
Na instituição, professores como o Renato Torres Pinheiro, que esteve na Coordenação do Centro por seis anos e há mais de vinte anos frequenta o local como pesquisador tem muita história para contar. “Minha primeira ida ao Canguçu foi em 2001, logo após me mudar para o Tocantins. Fui convidado pelo então diretor do Instituto Ecológico, Divaldo Rezende, que queria implementar estudos com aves no Centro de Pesquisa e promover a vinda de estrangeiros para a observação de aves. Submetemos alguns projetos, mas não fomos contemplados inicialmente. Em 2003, começamos a trabalhar no Parque do Cantão e no Canguçu, focando em estudos de aves, incluindo espécies ameaçadas, observação de aves e aspectos da biologia e diversidade dessas espécies”, relembrou ele
Desde então, Torres tem realizado diversos estudos no Canguçu. “A área é rica em espécies endêmicas, mas minha preferida é o pato-corredor, uma espécie ameaçada na região, que monitoramos há mais de sete anos. O trabalho contínuo no Canguçu tem sido essencial para o conhecimento e a conservação da avifauna local”, explicou ele.
Pesquisa documentada
De acordo com o professor e pesquisador Renato Torres, o Centro de Pesquisa Canguçu está em um momento especial de celebração e reflexão sobre suas contribuições científicas. Em comemoração aos 25 anos do centro, um e-book está sendo preparado há três anos, reunindo pesquisas realizadas ao longo das últimas duas décadas. Esse trabalho sintetiza o vasto conhecimento acumulado sobre a fauna e a flora do Canguçu.
Para se ter uma ideia da produtividade científica no Canguçu, o professor Renato conta que, nos últimos anos, quase 50 artigos foram produzidos por diferentes pesquisadores. “Temos artigos sobre aspectos da atmosfera, sequestro de carbono, invertebrados, abelhas, peixes, descrição de novas espécies, quelônios, crocodilianos, aves”, destaca o professor. Os quelônios, em particular, talvez tenham sido o grupo mais bem estudado, com tartarugas sendo pesquisadas desde 2001. Há também estudos sobre jacarés, aves migratórias e ameaçadas, e mamíferos, com pelo menos meia dúzia de artigos publicados. A produtividade dos pesquisadores da UFT e de outras instituições brasileiras e estrangeiras tem sido enorme, abrangendo uma variedade de temas, incluindo plantas medicinais, dentro e ao redor da reserva do Canguçu.
Renato explica ainda, que a riqueza de espécies é um dos grandes destaques do centro. Dentro de seus pouco mais de 60 hectares de reserva, foram catalogadas 350 espécies de aves. Essa diversidade torna o Canguçu um dos destinos mais procurados por observadores de aves, tanto do Brasil quanto do exterior. A área não apenas abriga uma grande variedade de espécies, mas também possui aves endêmicas da região da bacia do médio Araguaia e da bacia do Araguaia Tocantins, além de muitas espécies ameaçadas de extinção.
A riqueza de mamíferos de médio e grande porte no Canguçu também merece menção segundo ele. O número de espécies encontradas no centro é comparável ao do Parque Estadual do Cantão, que possui uma área quase 100 vezes maior, e ao do Parque Nacional do Araguaia, na ilha do Bananal, com 250 mil hectares. Essa comparabilidade sublinha o papel fundamental do Canguçu na conservação e na aquisição de conhecimento sobre a biodiversidade regional, destacando-se como uma área singular para estudos e observação da natureza.
Conhecendo mais sobre o Canguçu
Em uma conversa com o atual coordenador do Centro de Pesquisa Canguçu e Pró-reitor de Pesquisa e Extensão da UFT, professor Raphael Sanzio, ele compartilhou sobre a importância e as multifacetadas funções do Canguçu: “O Canguçu é uma região muito preservada, com uma grande quantidade de registros de fauna e flora. Temos diversas publicações científicas, sustentando a pesquisa de várias universidades do Brasil. O Canguçu é também uma vitrine para entidades internacionais que frequentemente assinam parcerias de pesquisa devido à sua peculiaridade e estrutura única, de frente para a Ilha do Bananal, na beira do lago do rio Javaés”.
O espaço possibilita o ensino de graduação, com muitas disciplinas realizando aulas práticas anualmente em suas dependências, ou seja, o centro cumpre seu papel de favorecer o ensino, a pesquisa, a extensão e a inovação de forma gratuita. “Também é aberto para educação ambiental e ecoturismo, atraindo pessoas apaixonadas pela natureza para contemplar e observar a vida selvagem, sempre com orientação para evitar impactos ambientais”, reinterou ele..
E pra quem pensa que o local não conta com estrutura, a tão esperada chegada da energia elétrica aconteceu, o que aumentou sua sustentabilidade, substituindo o uso anterior de geradores a diesel. Também possui acesso à internet via Starlink, proporcionando segurança e a capacidade de enviar pesquisas em tempo real. “Estamos instalando novas placas solares fotovoltaicas para suprir toda a demanda do centro, compensando o uso de energia elétrica durante a noite”, contou ele.
O Centro de Pesquisa Canguçu tem sido uma peça-chave na pesquisa científica, educação e conservação ambiental, refletindo sua importância contínua para a Universidade Federal do Tocantins e para a comunidade científica global.
Como visitar o local?
Ficou com vontade de conhecer de perto este lugar também?Conhecer as belezas do Canguçu, tanto para uma experiência pessoal com o ecoturismo, quanto para pesquisa, ensino e extensão? As reservas podem ser feitas pelo e-mail cangucu@uft.edu.br ou pelo Whatsapp (63) 98124-9768. Para confirmar a reserva, preencha e encaminhe o formulário correspondente disponível no página do Canguçu, na aba reservas e verifique a disponibilidade de datas.