Por Marcilene Lucena
Preciso explicar os motivos que fizeram a palavra “agora” estar entre aspas no título? Não, né? Mas vou explicar mesmo assim, pois esta “conversa” não estaria acontecendo se não fosse a tragédia de Camocim-CE.
Não é de agora que policiais estão doentes, física, metal e emocionalmente. Não é de agora que policiais são uma das classes trabalhadoras que mais cometem suicídio. E NÃO, muito embora com uma repercussão tremenda, não foi o primeiro caso onde um policial, seja civil, militar ou penal, assassina colegas de trabalho.
A questão é justamente essa, temas como este somente repercutem quando tragédias acontecem. A natureza insalubre e estressante da atividade policial faz com que 13% (treze por cento) do efetivo seja afastado, a cada ano, para tratamento de saúde. Isso não é normal, não deve ser concebido como natural e necessita de atenção, antes que mais tragédias aconteçam.
Ninguém procura uma delegacia para contar boas notícias. As pessoas procuram um policial para contar partes dolorosas de suas vidas. Falam com tristeza sobre bens roubados, sobre o terror de ter ficado sob a mira de armas, como foram agredidos, enganados, ameaçados, aliciados, violentados. Não se escuta, incólume, histórias como essas todos os dias. É impossível não ser afetado de maneira contundente por uma carga tão pesada de sofrimento e tragédia diária, mesmo que a história não seja sua… Até mesmo porque, quando essas histórias chegam até um policial, ele passa a ser parte dela. Seja qual resultado final se obtenha.
Acrescido ao que se ouve e se vivencia todos os dias, policiais são caçados por criminosos, simplesmente por fazerem seu trabalho. Em muitos lugares em nosso país, policiais não estendem sua farda ao sol, pois temem ser identificados, perseguidos e mortos. Um policial identificado durante um assalto será EXECUTADO, quase que em 100% das vezes que isso ocorrer. Isso acontece todos os dias. E não é de AGORA…
E não é somente a dor da vítima ou o ódio do criminoso, vivenciados diuturnamente, que tornam os policiais tão vulneráveis. Policiais são, também, os trabalhadores que mais sofrem assédio moral e são oprimidos em seus labores. Policial vive em “sobreaviso” eterno. Policial tem a obrigação de agir, mesmo de folga e estando em um passeio de família. Policial tem dedicação exclusiva e parece que o Estado passou a ter exclusividade sobre ele, também. Uma exclusividade tacanha, mesquinha, desprovida de zelo, amplamente irresponsável e completamente covarde. O Estado não cuida do policial, não se importa com os assédios sofridos, as perseguições contumazes ou a exploração desmedida, sendo seu único esforço em punir e vilipendiar.
Policiais estão adoecendo, policiais estão se matando, policiais estão matando uns aos outros…
Algo precisa ser feito!
O Estado fará?
Duvido!
A população se importa?
A população desconhece o problema em sua essência, mas a verdade é que, se importando ou não, os resultados dessa condição dos policiais refletem diretamente na qualidade de polícia que estamos tendo.
O que devemos fazer, então?
Devemos começar a cuidar uns dos outros. Estarmos atentos diante do sofrimento de um irmão ou irmã policial. Não sermos conviventes com exploração, perseguição, assédio ou qualquer outra atitude ilegal, imoral e que está nos consumindo como categoria. Devemos nos unir para que os cuidadores sejam cuidados… se não pelo o Estado ou pela sociedade, pelo menos um pelo outro… Sob o risco de a manutenção desse estado doentio nos consumir por completo… primeiro como profissionais, depois como cidadãos e, por fim, como seres humanos.
Os policiais estão pedindo socorro! Que ao cobrar do Estado e da sociedade alguma atitude, possamos ter a capacidade de por nós mesmos olhar para nossas feridas e cuida-las, olhar para nossos irmãos e irmãs e nos importarmos com cada um deles…
É um processo lamentável e excruciante esse definhamento que vive os profissionais da polícia… Parecemos inertes, passivos, acovardados… E essa inação está nos matando!
Marcilene Lucena
Presidente da FEIPOL-CON